Decorreu no Anfiteatro 131 do Colégio do Espírito Santo, no dia 24 de novembro, o 1.º Encontro de Bibliotecas na Universidade de Évora com o tema “O Papel das Bibliotecas num Mundo em Mudança: refletir, inovar, conectar e aceder”, uma iniciativa que reuniu especialistas nacionais e internacionais para refletir sobre os desafios emergentes das bibliotecas contemporâneas e sobre o papel estratégico destas instituições no acesso democrático à informação, na mediação tecnológica e no apoio à produção científica.
Com um programa estruturado, o encontro procurou promover um espaço de diálogo aberto, de partilha de experiências e de identificação de caminhos de inovação capazes de fortalecer as bibliotecas enquanto pilares de conhecimento, inclusão e cidadania. Na sessão de abertura, Noémi Marujo, Vice-Reitora para a Comunicação, Promoção Institucional e Informação Documental da Universidade de Évora, sublinhou que as rápidas transformações sociais e tecnológicas exigem das bibliotecas uma capacidade renovada de adaptação e liderança. “As bibliotecas revelam hoje a sua natureza transformadora. Já não são apenas repositórios ou guardiãs de livros. Elas ocupam uma posição essencial na forma como lidamos com a informação, a tecnologia e o conhecimento. Tornaram-se espaços centrais num ambiente onde tecnologia, saber e participação social se interligam. À medida que o mundo digital cresce e se torna mais complexo, estes espaços desempenham um papel ativo na mediação entre as pessoas e a informação, funcionando como plataformas de acesso, inclusão e aprendizagem contínua”, disse.
A Vice-Reitora da UÉVORA destacou o papel mediador das bibliotecas num mundo marcado pela complexidade digital, defendendo que a transformação digital “não se resume a disponibilizar acervos online”, mas implica criar ambientes onde comunidades académicas e sociais “possam experimentar novas tecnologias, desenvolver literacia digital, trabalhar com dados, explorar ferramentas criativas e participar criticamente na sociedade em rede”. Sublinhou, ainda, que estas instituições são “infraestruturas invisíveis que sustentam a comunicação académica, preservam dados de investigação, garantem o acesso aberto e fortalecem práticas de ciência responsável”.
Reconhecendo o valor social das bibliotecas, Noémi Marujo realçou que elas “promovem encontros, estimulam diálogos e oferecem oportunidades de aprendizagem que contribuem para a participação cívica”. Por isso, concluiu, “são instituições-chave não apenas do passado, mas também do futuro, capazes de preservar memória, impulsionar inovação e facilitar o acesso ao conhecimento”. Para Noémi Marujo, o encontro organizado pelos Serviços de Biblioteca e Informação Documental e a Reitoria cumpriu o seu propósito como um “espaço de diálogo e de construção conjunta, fortalecendo as bibliotecas e as comunidades que nelas encontram conhecimento, orientação e inspiração”.
Na sessão de abertura, Luís Santos, Diretor Geral do Livro, Arquivos e Bibliotecas (DGLAB), apresentou uma visão integrada da missão contemporânea das bibliotecas, que qualificou como “guardiãs da memória e laboratórios de novas formas de conhecimento. Num mundo marcado pela aceleração tecnológica, pela crise de confiança na informação, pelas desigualdades sociais e por uma profunda transformação nas formas de ler, aprender e conviver, o papel das bibliotecas torna-se ainda mais decisivo”.
Para Luís Santos, as quatro dimensões que definem a temática do 1º Encontro de Bibliotecas (refletir, inovar, conectar e aceder), “não são compartimentos estanques. Alimentam-se mutuamente. Uma biblioteca que reflete sobre o seu papel está mais preparada para inovar de forma pertinente. Uma biblioteca que inova consegue criar novas formas de conexão com a comunidade. Uma biblioteca que se conecta amplia o alcance do seu trabalho e reforça a sua capacidade de garantir acesso. E uma biblioteca que assegura o acesso efetivo ao conhecimento e à cultura torna-se terreno fértil para mais reflexão, mais inovação e mais ligações significativas. No fundo, o papel das bibliotecas num mundo em mudança é ajudar a sociedade a não se perder na mudança. É oferecer ancoragem sem imobilizar, abrir portas sem deixar ninguém para trás, articular tradição e futuro. Ao assumir-se como espaços de pensamento crítico, de experimentação responsável, de encontro plural e de acesso equitativo, as bibliotecas contribuem para uma democracia mais robusta, para comunidades mais coesas e para cidadãos mais autónomos e informados”.
A mesa-redonda dedicada ao tema “Bibliotecas Híbridas: novas formas de servir entre o físico e o digital” reuniu contributos de especialistas que analisaram a integração entre espaços físicos e digitais, os impactos da transformação tecnológica, as necessidades dos utilizadores e os desafios de gestão. O moderador, Silvestre Lacerda, lançou questões críticas sobre a forma como as bibliotecas universitárias lidam hoje com a bibliometria e sobre como os gestores equilibram métricas com o foco central no público.
Zélia Parreira, Diretora da Biblioteca Pública de Évora, destacou que o lema fundamental da biblioteca pública é “não deixar ninguém para trás”, o que exige acompanhar as mudanças dos tempos através de modelos híbridos que unam o melhor dos dois mundos. Realçou que “uma biblioteca híbrida amplia o alcance a toda a população, independentemente da geografia; a personalização dos serviços depende de ferramentas digitais, ainda que estas não substituam a mediação humana; e, ainda, que as bibliotecas têm um papel essencial na promoção da literacia digital e na redução do fosso tecnológico”. Identificou também riscos, como a desigualdade de acesso, a necessidade de recursos humanos adicionais, a atualização constante de competências e a possível desvalorização do espaço físico. Defendeu estratégias assentes em planeamento estratégico, serviços inovadores e mediação ativa, conjugando sustentabilidade financeira com inovação.
Por outro lado, Maria Margarida Vargues, em representação dos Serviços de Documentação e Informação da Universidade do Algarve, apresentou uma análise histórica da evolução das bibliotecas, desde o modelo tradicional até à explosão informacional das décadas de 1970 e 1980, e ao surgimento de novas formas de armazenamento na década de 1990. Hoje, afirmou, “as limitações físicas e temporais desapareceram, colocando novos desafios como reinventar espaços perante a crescente preponderância dos conteúdos digitais; considerar a integração de agregadores que permitam consulta de múltiplos catálogos; refletir sobre a introdução de chatbots baseados em IA nos serviços de referência; garantir que a relação humana não se perde; e, por último, responder ao surgimento de novos serviços, como makerspaces, que promovem criatividade e literacia digital”. Alertou ainda para desafios de gestão relacionados com perfis profissionais, recrutamento e competências exigidas pelas bibliotecas contemporâneas.
Já Susana Lopes, Diretora da Biblioteca da Nova School of Business and Economics (NOVA SBE), reforçou que “nunca o espaço da biblioteca foi tão utilizado como agora”, sublinhando a crescente procura de ambientes de confiança, conforto e pertença. Referiu que a biblioteca da Nova SBE regista cerca de duas mil entradas por dia, exemplo da relevância dos espaços físicos no atual ecossistema informacional. Para a oradora, a biblioteca híbrida é um modelo integrado, não uma soma de canais, que proporciona uma experiência fluida entre o presencial, o remoto e o móvel. Entre os seus benefícios, destacou “o acesso ampliado 24/7, a diversidade e atualização contínua de conteúdos, a eficiência operacional e a melhoria da imagem institucional. Defendeu ainda uma abordagem centrada na pessoa, assente em co-design de serviços, inclusão de diferentes perfis de literacia e espaços físicos reinventados que combinem zonas silenciosas, áreas colaborativas e tecnologias de apoio como self-checkout ou lockers”. Sublinhou, por fim, a importância da formação das equipas e de um planeamento estratégico alinhado com a missão das bibliotecas.
O encontro integrou igualmente um conjunto de momentos de apresentação e discussão dedicados a explorar as práticas emergentes no universo biblioteconómico, com especial enfoque nas dinâmicas de inovação, na articulação entre recursos físicos e digitais e na construção de ambientes inclusivos e responsivos às necessidades dos utilizadores. Estas intervenções reforçaram o compromisso das bibliotecas com a promoção da literacia informacional, a democratização do acesso ao conhecimento e a criação de ecossistemas colaborativos que consolidem o seu papel enquanto infraestruturas estratégicas das instituições académicas e da sociedade em geral.