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Diretor Fundador: João Ruivo Diretor: João Carrega Ano: XXVIII

Opinião As crises na educação

Chácaras de Inoã, 4 de agosto de 2045

Estávamos em 2005. Eu passara a viver no Brasil e muitos dos visitantes brasileiros da Ponte me procuravam para esclarecimento daquilo que tinham presenciado nas visitas. A maioria dos questionamentos incidiam sobre... “crise” – os mais de trinta anos da Escola da Ponte tinham sido anos de lições de resiliência dadas por uma equipe coesa e em comunidade.
Comecemos pelas crises externas como, por exemplo, quando o Ministério da Educação adiou sem prazo estabelecido a assinatura do Contrato de Autonomia.
Iniciou-se uma frente comum de tentativa de resolução, desde os pais, que se movimentaram em diferentes instâncias do próprio ministério e na confederação dos pais, em estreita colaboração com os professores e outros agentes educativos e com responsabilidade no mundo da investigação, bem como acadêmicos de todas as universidades, num movimento sem procedentes para pressionar o Ministério e defender a Ponte.
Quanto a crises internas, posso referir os momentos de alargamento a novos ciclos de ensino, o que aportou novas exigências de organização e gestão pedagógica; o alargamento da equipa de orientadores educativos, a criação de novos espaços de aprendizagem, medida que, infelizmente, contribuiu para reduzir tempos e espaços de lazer.
Tudo isso foi feito quase “da noite para o dia”, num projeto simples, mas que ganhou complexidade organizacional. Em 2003, ainda sentíamos os efeitos dessa rápida e atempada mudança. Como a ultrapassamos?
Fazendo reajustes estratégicos constantes, discutindo com toda a equipe os problemas que iam surgindo, procurando coletivamente algumas respostas imediatas, urgentes.
O nosso processo de formação em projeto ia decorrendo, porque o tempo tinha demonstrado que estava tudo por fazer e talvez, com a construção de um novo prédio para a escola, se aproximasse nova crise.
Colhi algumas “impressões” de participantes no projeto:
“Uma coisa que me vem bastante à cabeça é essa relação entre a prática na Ponte e as imposições curriculares. De modo que até chegamos a pensar abandonar o currículo “pronto-a-vestir” do Ministério da Educação.
O Contrato de Autonomia seria uma espécie de "permissão" assinada pelo Ministério, para que as Escolas Públicas pudessem organizar-se de um jeito próprio, sem, no entanto, deixarem de atentar ao cumprimento do currículo?
A ideia original seria essa. O Ministério passaria para as escolas grande parte das competências que detém (a nível financeiro, gestão de pessoal e de organização). Paralelamente, as escolas teriam de prestar "contas" mais rigorosas ao Ministério (até no nível de resultados escolares).”
Infelizmente, o que começou como uma boa ideia (em 1998) demorou muito tempo para ser aplicado. E, quando foi aplicado, o Ministério tentou generalizar essa medida, aplicá-la a todas as escolas. Melhor dizendo, o Ministério impôs, regulamentou que todas as escolas tivessem os seus contratos de autonomia – e aconteceu o desvirtuamento da inovação.
Esse contrato nos trouxe um esperançoso alento, que se desvaneceu. Muito do que pretendíamos fazer não estava contemplado na burocrática regulamentação da Lei de Bases – e o Contrato de Autonomia se revelou documento contraditório.
Quando o Ministério da Educação tentou implementar um novo sistema de avaliação de desempenho dos professores, tentou obrigar a Ponte a adotá-lo. Mas, o Contrato de Autonomia estabelecia os moldes em que essa avaliação deveria ser feita. E fizemos uma avaliação solidária... contrária ao faz-de-conta ministerial.

José Pacheco
Professor, fundador do projeto educativo da Escola da Ponte