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Opinião Livros & Leituras

20-10-2023

A Cidade da Vitória (D. Quixote), de Salman Rushdie, vai buscar ao registo das antigas epopeias da Índia uma história fabulosa que tem como narradora Pampa Kampana, bafejada pelo poder demiúrgico da Deusa, que com o seu verbo encantado cria a partir de um saco de sementes um reino que durou uns duzentos e cinquenta anos, do século XIV em diante, com uma presença lusitana, compondo um longo poema, descrevendo o modo como criou e manteve a cidade de Bisnaga, através da palavra sussurrada, e tudo o que lhe sucedeu enquanto viveu, da ascensão à dissolução, com digressões míticas. Um livro que é uma maravilhosa efabulação.

As Aventuras de Sindbad (E-Primatur), de Gyula Krúdy (1878 – 1933), escritor húngaro, criador do húngaro moderno, descreve neste conjunto de histórias a vida de Sindbad, o eterno amante insatisfeito, distribuídas pela juventude, maturidade e morte, com o pano de fundo do fim do Império austro-húngaro, num poderoso registo literário, numa investigação sobre o amor e as suas infinitas declinações e o retrato de uma sociedade para sempre desaparecida nos escombros da guerra.

Retrato de Grupo com Senhora (Cavalo de Ferro), de Heinrich Boll (1917 – 1985), Prémio Nobel em 1972, reedição da sua obra maestra, é um livro fundamental para compreender toda uma geração e a História da Alemanha do século passado, servindo-se da biografia de uma mulher, investigada a fundo pelo autor-narrador que vai desenterrando factos, personagens e acontecimentos, e construindo um mural caleidoscópio de uma anti-heroína contemporânea, que viveu o nazismo e pós-guerra.

Zuckerman Libertado (D.Quixote), de Philip Roth (1933 – 2018) faz parte da série que tem o escritor Nathan Zuckerman como protagonista, quase ”alter ego” do escritor. Um êxito inesperado com a publicação de um romance escandaloso, lança-o nos braços da fama com um bom pecúlio na conta bancária, e tudo descarrila nas suas relações familiares, assediado por aventesmas e celebridades, numa América convulsa, num registo de uma comicidade a toda a prova. O passado é uma terra estranha.

Jornadas pelo Mundo (Quetzal), de Bernardo Correia de Melo, Conde Arnoso (1855 – 1911), um dos Vencidos da Vida, amigo de Eça de Queirós, oficial do Exército, secretário pessoal do rei D. Carlos, enviado em 1887 em missão diplomática a Pequim, por altura da assinatura do tratado da entrega da tutela de Macau a Portugal. Dessa longa viagem  deixou este relato pormenorizado dos lugares por onde passou, do Suez, Singapura e Saigão, de Macau a Xangai, até à Grande Muralha, tornando-se assim num dos grandes relatos de viagem do século XIX português.

Anais Nin(Temas e Debates), de Noel Riley Fitch (n. 1937, Connecticut), tem como objecto ”a vida literária e erótica” da escritora do fabuloso “Diário”, e que segundo Erica Jong, “ nenhuma escritora contou tão honestamente” como ela, ”a história da sexualidade da mulher”. Nesta biografia a autora “descodifica os segredos da escritora”, dando “um retrato íntimo e hipnótico da vida apaixonante, tumultuosa e por vezes amargamente dolorosa”.

Do Libertino (Tinta-da-china), de Rui Sousa é um estudo muito bem informado sobre a figura do libertino, desde a sua origem no século XVI aos nossos dias, com variantes no surrealismo e ao abjeccionismo, e no caso português, centrando-se em Luiz Pacheco com encarnação desse ideal de liberdade, contra todas as formas de opressão sociais e religiosas.

Manipulação (Bertrand), de Mark Hollingsworth, com o subtítulo “O KGB e as Democracias Ocidentais”, é uma inquietante demostração da influência dos serviços secretos russos, outrora soviéticos, que continuam a operar segundo rígidos critérios de subversão, incluindo a desinformação, intoxicação, mentira e chantagem, a uma escala nunca vista. “Um agente do KGB nunca se reforma”.

A História do Universo em 100 Estrelas (Planeta), de Florian Freistetter, astrónomo austríaco, é um entusiasmante mergulho no cosmos, através da observação de cem estrelas que contam uma história antiga, projectando um futuro que pode ser ou não, umas mais distantes outras não, umas vivas outras ainda por nascer na vastidão incomensurável dos céus distantes, fixas ou viajantes, grandes ou pequenas de todas as cores e feitios.

Um Ponto Azul-Claro (Crítica), de Carl Sagan, é um clássico da astronomia que continua a fascinar os leitores. Inspirado pela icónica fotografia da nave Voyager 1, em que a Terra é apenas um ponto de luz na profundeza do espaço sideral, o astrofísico relata e propõe como a aventura humana no espaço é um sonho milenar, sendo que o espaço exterior resulta da projecção do modo instrumental e mecânico da sua observação.

Castélio contra Calvino (Assírio & Alvim), de Stefan Zweig, subtítulo “ou uma consciência contra a violência” com tradução de Sara Seruya e Teresa Seruya, publicado em 1936, é um ensaio demolidor que nos apresenta um herói humanista, quase desconhecido do século XVI, Sebastião Castélio que se opôs à ditadura teocrática de Calvino, um dos mais infames fanáticos que a Europa já conheceu. Castélio foi um espírito livre que defendeu a liberdade de consciência acima de qualquer religião ou ideologia.

A Religião Woke (Guerra & Paz), de Jean-François Braunstein, é um estudo fundamental para compreender o delírio reaccionário que tende a infectar a cultura e a ciência, com teorias absurdas, numa girândola de disparates dignos das seitas de “eleitos” e fanáticos de antanho, agora suscitada pelas universidades americanas. Como disse George Orwell :”É preciso ser intelectual para escrever tais coisas: uma pessoa comum não poderia jamais alcançar uma tal palermice”.

José Guardado Moreira
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