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Diretor Fundador: João Ruivo Diretor: João Carrega Ano: XXVII

Opinião Livros & Leituras

03-08-2022

Mas Há Melhor do que Isto? (Narrativa), de Kurt Vonnegut, do qual se comemora este ano o centenário de nascimento, é um conjunto de palestras dadas a finalistas universitários, ao longo dos anos, expondo de forma brilhante a verve contestatária de um dos expoentes das letras americanas do último século. Humanista por definição pessoal, defensor do livre-pensamento, Vonnegut foi um pacifista e crítico da sociedade contemporânea. O seu humor cáustico e desarmante é herdeiro de um Groucho Marx. “ A bela Terra – podíamos tê-la salvado, mas fomos demasiado ordinários e preguiçosos”.
A Ilha das Árvores Desaparecidas (Presença), de Elif Shafak, escritora anglo-turca, elegeu Chipre, e a vida de Kostas e Defne, como húmus fértil para narrar um hino à relação entre o reino vegetal e os humanos que dele dependem. A voz de uma figueira centenária, essa árvore do paraíso, com outras conotações na mitologia, encarna a magia da esperança por algo de novo que floresça no mundo, antes que tudo desapareça. Os dois adolescentes, ele grego, ela turca, vão dar corpo à história da ilha, outrora verde, dividida e dilacerada. A memória das árvores e dos ossos recordam para sempre à espécie humana algo de inesquecível, tanto no amor como na morte. Uma árvore mesmo transplantada nada esquece.
Um Almoço de Negócios em Sintra (Guerra & Paz), de Gerrit Komrij (1944 – 2012), escritor holandês que viveu e foi sepultado em Vila Pouca da Beira, poeta e cronista de verve acirrada. Este livro de um misantropo assumido, que se enamorou pelo nosso país, conhece agora uma reedição. As histórias retiradas da visão de um estrangeiro sobre os portugueses são uma colecção de cromos que não perdeu o viço nem a oportunidade. A perspectiva de quem conviveu e absorveu as idiossincrasias nacionais são de uma acuidade hilariante. Nada lhe escapa deste povo que se esconde de si mesmo. Tradução e posfácio de Fenando Venâncio.
Os Cavalos de Hitler (Porto Editora), de Arthur Brand, conta-nos a história da descoberta de um conjunto monumental de estatuária nazi, que eram dadas como destruídas depois do final da guerra. A busca leva o investigador holandês de arte a um submundo de antigos nazis, comerciantes de arte roubada e ligações entre a antiga Stasi e os soldadesca russa que ocupou a Alemanha. As imponentes estátuas, encomendadas a escultores afectos ao regime nazi, são o testemunho de uma era, mas também modo de financiar actividades ilegais no presente. A realidade parece sempre mais extravagante que a melhor ficção.
A Procura da Língua Perfeita (Gradiva), de Umberto Eco é um estudo que foi concebido no âmbito de uma colecção que se propunha estudar os diversos aspectos da cultura europeia, como assinala Jacques Le Goff no prefácio. O autor italiano debruça-se sobre a magna questão de haver ou não uma língua primordial da qual todos os restantes idiomas não seriam mais que derivações. Partindo do mito de Babel, analisa as diversas teorias e autores, desde a Cabala a Dante, de Lull a Dee, de Kircher a Wilkins, sem esquecer o I Ching e o esperanto. “Reler o que fizeram os nossos antepassados não é uma mera diversão arqueológica, mas uma espécie de precaução imunológica”.
Português de A a Z (Guerra & Paz), de Marco Neves, que tem como subtítulo “Armadilhas e maravilhas da língua”, é uma óptima ferramenta para conhecer um pouco melhor o nosso idioma e, como diz o autor, para desarmadilhar a língua. Capítulos directos ao assunto da ortografia e da gramática, muito úteis nos dias que correm, quando as malfeitorias do acordês semeiam a confusão. As duas entradas derradeiras, sobre os palavrões e a invenção da escrita são de antologia.
Pessoa, uma biografia (Quetzal), de Richard Zenith, é uma obra fundamental para compreender o enigma daquele que animou tantas máscaras no palco do teatro íntimo e impessoal, erguendo uma das obras mais inovadoras na literatura do século XX. Uma pesquisa aturada de anos que culminou nesta biografia, e que fará certamente parte do cânone pessoano. Um dos grandes livros do ano.
No Limiar da História (Objectiva), de Patrick Wyman, tem como subtítulo “Renascimento, Reforma e os 40 anos que mudaram o mundo 1490- 1530”. O autor procurou, através das vidas de dez personagens da época, desde Colombo, Lutero a Solimão, entender como a Idade Média deu lugar à Era Moderna, com o uso da imprensa, da pólvora na guerra, a dissidência religiosa, a inovação na ciência e o poder da banca, transformando um mundo aparentemente estático, alterando por completo o destino da Europa, e do mundo conhecido e desconhecido, movimento que perdurou pelos séculos seguintes até aos nossos dias.

José Guardado Moreira
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